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15 de setembro de 2009
CELEBRIDADES
Nei Duclós (*)
Hábitos adotados hoje faziam parte do index na minha infância. Roupa cortada na altura da canela, por exemplo, a famosa “calça de pular sanga”, não era admissível para os garotos. Se o tecido chegasse até a segunda metade da perna, teria de seguir até o chão. As mulheres são mais inteligentes e fazem rodízio de tendências, mas a porção masculina parece ter estacionado nessa tendência bizarra de usar calças decepadas de suas pontas, sem jamais voltar à bainha italiana, que sempre foi o fino da bossa.
Outro comportamento execrado era a máscara. Sujeito metido a besta levava cascudo, hoje não sai de frente das câmaras. Aquele sorrisinho de lado de quem está por dentro virou epidemia, mas já foi sinal evidente de que o sujeito precisava de um corretivo. A mais eficiente punição era a indiferença coletiva. Ignorar o bam-bam-bam ajudava a colocá-lo no seu lugar. Mas veio a cultura da malandragem, a esperteza caipira, o estrelismo sem motivo e pronto, acabamos na vala comum da celebração da mediocridade.
É enorme o espaço ocupado por pessoas nada-a-ver a deitar abobrinhas sobre seu ego. Enquanto gênios vivem e morrem na sombra, temos todo santo dia o vivaracho e o canastrão, sem esquecer do político e o empresário da hora, a falar sobre educação, saúde e outros “diferenciais”. Hoje, reiterar o Mesmo é insistir na diversidade. Se alguém apostar na uniformidade, será marginalizado. Não há vida possível para quem não concorde que a unanimidade seja, invariavelmente, burra. A aritmética, por exemplo, é uma unanimidade, e por isso talvez o fato de alguém saber a tabuada de cór é tido como uma idiotice.
Falei em gênios que vivem na sombra. Perdemos recentemente José Gomes, maestro, compositor, intérprete, pesquisador de música popular. Revolucionou a música de raiz ao fazer os arranjos do antológico disco do grupo “Os Gaudérios” no final dos anos 1950, mas não ficou no nativismo. Criou projetos de artesanato e fabricação de instrumentos como rabeca acústica, chorongo , baixo acústico, calimba cromática, violino mudo. Esse tipo de informação está na Internet, mas jamais vi Zé Gomes na televisão a falar sobre suas especialidades ou mesmo interpretando suas obras (duas de suas canções, com muita honra, são com poemas meus). Agora é tarde demais. O país está surdo, com os sentidos manipulados pela cultura de pular sanga.
RETORNO - 1. (*) Crônica publicada nesta terça-feira, dia 15 de setembro de 2009 no caderno Variedades, do Diário Catarinense.
2. O video acima, com a canção No Mar, Veremos (poema de Nei Duclós com música de José Gomes), será incluído na Maratona Literária 4, que acontece em Porto Alegre a partir do próximo dia 18, quando a população riograndense começa a adentrar o gramado para a Semana Farroupilha, nas comemorações do 20 de setembro (data em que Bento Gonçalves tomou Porto Alegre e iniciou uma guerra, em 1835, que durou dez anos).
3. Mostrei esse video, mais outro sobre a cancão Minuano, também com José Gomes, para Fernando Ramos, do Jornal Vaia e ele me disse: "Ótimas! No mar, veremos é de arrepiar. O José Gomes é fera também. Grato por essa emoção que me proporciona. Vou encaminhar para o pessoal que está organizando a coisa técnica da maratona, para ser tocado lá no final de semana." Meu sonho é esse: que tanto a maestria de José Gomes quanto minha poesia participem das celebrações da data magna riograndense.
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