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15 de julho de 2009
RIQUEZA
Nei Duclós (*)
Onde está a riqueza atualmente? Em quem possui, e pode repassar, um trilhão de dólares, como o atual governo americano. Nenhuma empresa, corporação, magnata tem esse dinheiro disponível. O Estado dispõe de todos os recursos, e numa canetada, pode concentrar ou distribuir renda. Suas infinitas ramificações, do presidente ao ministro, do governador ao prefeito, do senador ao vereador, do administrador ao secretário, têm acesso ao cofre, a soma da nação expropriada.
Há um paradoxo nas grandes derrotas políticas. Quando o nazismo perdeu a guerra, seus paradigmas espalharam-se pelo mundo, como o aparelhamento estatal a cargo de uma corrente política, a propaganda enganosa, a imposição de verdades virtuais por meio da mídia e da indústria cultural, a idéia de raça (ou “sanguebom”) se impondo sobre a identidade formatada pela cultura e o comportamento. Aconteceu algo idêntico quando a URSS implodiu. O capitalismo de Estado ganhou o mundo e acaba de derrubar o último bastião, situado em Washington, depois da crise financeira que abalou os mercados regados a especulação.
Para que o poder ilimitado do Estado funcione, é preciso corrupção pura e simples, alimentada pelo ilusionismo disseminado em massa, a cargo dos intelectuais orgânicos, os que usam a cátedra ou a notoriedade para expor projetos adotados pela rede estatal. É preciso também consenso na propaganda das vantagens do regime, no caso, a chamada democracia, um sistema híbrido entre o voto eletrônico e o rodízio café-com-leite de algumas personalidades, guindadas ao patamar de alternativa única.
Esse sistema se perpetua por meio do dinheiro arrecadado do suor da sociedade, que no Brasil atinge índices alarmantes, como a recente conclusão de que cada brasileiro trabalha cinco meses ao ano para sustentar o governo. Quando alguma coisa se opõe ao massacre, há pânico e imediata solidariedade contra a ameaça. Não se pode abrir mão da bufunfa tão arduamente conquistada depois de décadas de “luta”, quando todos os argumentos da exaustão popular foram colocadas na cesta da boa vida dos espertalhões.
Hoje, a riqueza das nações é o Estado de mão única. Indústria, comércio, serviços, cidadania? Isso não é poder. São apenas fontes arrecadadoras.
Variedades errou: A crônica publicada ontem neste espaço (nota: a edição impressa - e on line - do Diário Catarinense), intitulada "Cultura como estratégia", é de autoria de Amilcar Neves.
RETORNO - 1. (*) Crônica publicada excepcionalmente nesta quarta-feira, dia 15 de julho de 2009, no caderno Variedades, do Diário Catarinense. 2. Imagem desta edição: ilustração publicada pela revista Sagarana para o poema "Sou um caso perdido", em que Mario Benedetti ironiza quem o acusava de parcialidade. 3. A partir de hoje, mais um link permanente no espaço aí do lado: Café Colombo. Trata-se de um programa sobre livros e idéias transmitido para Pernambuco pela Rádio Universitária FM (99.9 MHz) e para o mundo através da internet. O programa vai ao ar aos domingos, das 14h às 14h30, com reapresentação às segundas, das 20h às 20h30.
BATE O BUMBO: ESCÂNDALO NA FLIP
O blog Efeito Colateral denuncia o confisco de livros de autores que tiveram a ousadia de vender seus exemplares nas ruas de Paraty na Flip deste ano (na foto, o poeta Pedro Tostes, de mão para trás, aguarda o termo de apreensão de 16 exemplares do seu livro de poemas). É o desmascaramento total de uma situação que o Diário da Fonte denunciou no ano passado. É a ditadura em ação. Confiscar livros é nazismo puro.
As vítimas ficaram surpresas com a argumentação: a Flip (Festa Literária Internacional de Paraty), oficialmente, dizem os organizadores, não é um evento "comercial", portanto é proibido vender livro na rua. Claro que não. Comércio é para pobre. A Flip é marketing, a nobre arte dos deuses do rabo preso. Corja. Sugiro o seguinte: na próxima Flip, os autores que vendem livros na rua (entre os quais me incluo, desde 1969) devem comparecer em massa no evento milionário, sustentado por dinheiro público. Essa falsa democracia, que eterniza privilégios, precisa ser combatida. É preciso derramar de verdade esse leite coalhado.
Não prometo comparecer. Aos 60, não disponho de condições cardiovasculares para peitar fiscal ao vivo (posso querer chutar a cara de uns e outros e isso não acabaria bem). Mas a mocidade (ah, que bela palavra, muito melhor do que juventude), mais determinada e estratégica, deve se organizar e fazer isso mesmo.
Em 1969, quando Marco Celso Viola, eu e outros autores fomos às ruas vender nossos livros mimeografados (bem antes da Geração Mimeógrafo carioca, viu professora Heloisa Buarque de Holanda!?) nunca ninguém nos confiscou livro nenhum. E isso que demos as maiores bandeiras, de calças surradas, cabelo comprido e coturnos, nas Praças da Alfândega, em Portinho, da República em Sampa e General Osório, no Rio. Costuma-se dizer: era o auge da ditadura. Vai ver o auge da ditadura é agora, quando todos acham que o regime é de liberdade. Estamos é tomando um solzinho no pátio do presídio.
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