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9 de julho de 2009

A FALSA CONVERSA DOS APRESENTADORES


Nei Duclós

Overdose de Rede Globo, mas vamos lá. Virou moda. William Bonner se vira para Fátima Bernardes para transmitir uma parte da notícia. Se fosse uma conversa real, ele estaria informando a colega do assunto. Mas logo em seguida Fátima continua do ponto em que Bonner interrompeu. Ou seja, ela sabia de antemão, claro. Então por que Bonner se virou para ela, fingindo que contava um causo? E pior, porque ela olha interessada como se estivesse sabendo aquilo da boca do apresentador ao seu lado? Por que eles assumem, cada um a seu tempo, fazendo rodízio, o papel do telespectador que escuta e vê?

A idéia é, sendo informais, romper com a barreira que separa os dois, que ficam lado a lado e de frente para o telespectador. Assim, criam um clima descontraído, como se duas comadres estivessem de papo entre si, observados por uma roda. É o uso de um hábito antigo, o chamado serão, transplantado de maneira equivocada para o noticiário. É mais um passo para romper com o autismo do esquema, pois até alguns meses atrás, eles falavam entre si e deixavam o telespectador de fora. Fala Losekan. É com você, Bonner. Agora eles dizem “boa noite a todos”.

Foi aqui, no Diário da Fonte, que notamos essa tabelinha fechada entre a redação e o link. O cumprimento “a todos” resolve o impasse. É com o telespectador , agora incluído, que eles estão falando. Mas a compulsão de olhar para o (a) colega ao lado não funciona. Fica forçada e não tem base para existir, já que os dois sabem com antecedência tudo o que será dito. São coisas mal resolvidas que custam a ter uma solução. Mas às vezes eles conseguem avançar um pouco.

O bom exemplo vem do esporte. Felizmente nesta quarta-feira, quando o Cruzeiro enfrentou pela primeira vez o Estudiantes em La Plata, pela decisão da Libertadores, caiu a ficha dos jornalistas esportivos sobre um velho equívoco, a altura de quem cabeceia a gol. Acho que foi a chegada de mais um comentarista, além do Falcão, que repôs as coisas no lugar. Até ontem, era comum dizer que fulano levou vantagem no cabeceio porque era o mais alto da área. “Fulano tem um metro e noventa e dois”, diziam. Mas aí alguém, acho que o novo comentarista, falou em tempo da bola. Se o jogador chega no tempo da bola, não importa a altura do jogador, disse ele. O cara pode ser baixo ou alto, não importa. O que vale é se ele chega junto. Ufa. Custaram. Enfim decobriram que futebol não é basquete nem vôlei.

Para isso servimos nós, o não remunerados jornalistas da internet. Para chamar a atenção dos pesadelos da linguagem, dos equívocos da mídia e forçar, com a crítica, a correção. Ganham os tubos para permanecer no erro e mais ainda quando nos ouvem e mudam. Mas há ainda muita coisa pela frente. Por exemplo. Ontem disseram que todo time deve jogar dentro de sua característica. Ou seja, criaram uma camisa-de-força para a equipe e querem que ela se comporte conforme esse figurino. Não existe essa de característica. Ou o time tem bons jogadores e consegue agir em equipe, ou trava tudo e apela para as patadas, como aconteceu mais um vez com os argentinos em La Plata.

Eles se expressam às patadas. Faz parte de sua natureza. Colocaram um assassino para marcar Kleber. Mas saíram com o zero a zero, graças ao bom desempenho do Cruzeiro e as excepcionais defesas de Fabio. O que não precisava era o disco arranhado do Galvão Bueno, que, uma vez a cada segundo, milhares de vezes, disse que na próxima quarta-feira o Mineirão estará lotado, todo azul. O Galvão é isso mesmo, o chato obsessivo do monopólio da transmissão esportiva.

O destaque da noite foi, mais uma vez, Ronaldo, que fez três dos 4 a 2 do Corinthians contra o Fluminense. Naturalmente os comentaristas disseram de novo que ele está acima do peso e se afoba na hora de correr para o gol. Ronaldo está com o peso que tem e é um estrategista da corrida e do toque de bola. Faz tudo certo, com suas tesouradas, deslocamentos e uso simultâneos de todas as partes das duas pernas para driblar e chutar. Ronaldo é cracaço, não precisa de ninguém dizer que ele é gordo ou afobado. Ronald resolve os nós que enfrenta por meio do manejo da sua arte. Os jornalistas deveriam fazer o mesmo. Desatar dificuldades aprofundando a competência do ofício.

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