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7 de julho de 2009

CONSENSO


Nei Duclós (*)

As palavras são expulsas de seus significados originais ou embaladas para prestar novos serviços. “Conteúdo”, por exemplo. Dez anos atrás era água num copo, agora é nota sobre celebridade. “Consenso” virou moda quando a ditadura precisou se consolidar depois de vários estragos. Os maganos se uniram e criaram o centrão de direita, que atropelou a emenda das Diretas Já e empossou no Planalto o atual presidente do Senado.

Hoje, o conteúdo do consenso é a chamada democracia, a que viveu à sombra da especulação financeira até o mercado explodir e ser chamado de bolha. Dois comediantes ingleses, em vídeo espalhado pela rede, mostram como se faz uma crise. Basta empacotar mentiras, vender por um bilhão de dólares e depois exigir ressarcimento por perdas e danos. Contra isso nenhum poder “democrata” foi contra. Ao contrário.

Quando um presidente pretende se perpetuar no cargo e para isso compra os congressistas ou convoca um plebiscito ilegal, é de se perguntar se essa democracia cevada no império da ciranda financeira não estaria revertendo o uso das palavras por puro interesse. É um trabalho possível, já que na indústria cultural visível (e patrocinada) foi erradicado o desmascaramento do sistema. É lei: humorista de TV se veste de mulherzinha, ponto.

Rir do poder era a forma de manter saudável a mente da cidadania expurgada de direitos básicos. O escracho e a crítica política, que tomam conta de milhões de espaços criados na internet, não chegam ao osso do sistema por excesso de dispersão. Permanece assim intacto o voto manipulado pelo marketing milionário e o rodízio de duas forças políticas idênticas, mas aparentemente antagônicas. Quando vemos ex-adversários de campanhas gargalhando juntos nos palácios republicanos, perguntamos por que nos submetemos ao novo voto de cabresto, o voto útil.

Para manobrar consciências, é convocada a antiga divisão legislativa, em que a situação ficava à direita e a oposição à esquerda. Levantar a hipótese de que estamos sendo manipulados por palavras soa como a verdadeira ingenuidade. Fica mais cômodo ceder à indiferença e deixar como está. As palavras acabam prisioneiras dessas caricaturas que ocupam o noticiário distorcendo tudo, para que saiam vencedores e se mantenham à tona até o final dos tempos.

RETORNO - 1. (*) Crônica publicada nesta terça-feira, dia 7 de julho de 2009, no cadderno Variedades, do Diário Catarinense. 2. Imagem desta edição: Diretas Já. Substitui a outra que estava no lugar e que poluía o visual do Diário da Fonte. Este é um jornal família.

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