Sim, o país tem solução e precisa ser drástica, segundo Fausto Wolff, o gauchão brabo do jornalismo e da literatura que morreu ontem, dia 5. Basta resgatar a verdade no jornalismo como primeiro passo (veja seu depoimento logo abaixo, na seção Retorno). Precisamos da verdade, pois nem gente nem produtos são mais necessários na ditadura especulativa. Vivemos sob o regime das representações. Um exemplo é o petróleo do pré-sal, que ainda nem foi extraído e já sujou as mãos do presidente em poses para a posteridade, ou seja, para a capa dos jornais do dia seguinte (a posteridade, no pesadelo do eterno presente, não ultrapassa as 24 horas e precisa ser reiterada todos os dias). Que nenhum veículo tenha notado o golpe de mídia revela o escândalo em que estamos metidos. Mas Lula é apenas fruto da especulação. O buraco é mais embaixo.
As pessoas não são mais necessárias como unidades da cidadania, já que o Estado foi sucatado, retaliado e terceirizado de todas as formas. Toda a grana preta carreada para as ONGs é apenas uma porção de uma realidade: a de que todo o dinheiro arrancado pelos impostos fica na mão das corporações ou das entidades privadas. Mas o que fazer com as pessoas extraídas de seu poder de cidadãos? O negócio é debochar delas. Vi hoje uma cena sobre seleção de gerentes em que os coitados dos desempregados dançam com balõezinhos coloridos par simular o trabalho em grupo. Falam até a exaustão em lideranças modernas, ou seja, as que eliminam a liderança em favor de um convívio artificial baseado na frescura.
Aí tinha um instrutor pontificando, naturalmente, pois a barbaridade, vista assim a olho nu, não passa de sacanagem, então precisa que alguém use os jargões da cultura fajuta que tomou conta do mundo do trabalho a partir dos anos 90. A palavra chave é “fundamental”. Tudo o que eles falam, ou seja, obviedades servidas em pó, pensamentos superficiais toscos, malandragens explícitas, estímulo às relações predatórias, é tratado como fundamental. É porque nada é fundamental num universo de atividades que não apitam no essencial, que é totalmente manipulado pelos meganhas do dinheiro especulativo.
Vi também uma jovem senhora falando asneiras sobre pesquisas de mercado. O que as pessoas precisam? Sobreviver, em primeiro lugar. Ou seja, morar e comer. Para isso precisam trabalhar, exercer atividades honestas remuneradas. Precisam ter acesso ao que os políticos vivem repetindo em vão, como saúde e educação. Precisam de cultura, informação, arte. Para que as pesquisas? Para inventar necessidades ilusórias nas pessoas. Para detectar demandas sinistras, como a vontade de destruir os outros (e disso se encarregam os videogames), trepar sem olhar a quem (e para isso serve a pornografia geral do mundo do espetáculo), fugir das responsabilidades (e para isso existe a psicologia de massa veiculada em programetes comportamentais das televisões).
Não é preciso fazer pesquisa de mercado para atender as necessidades das pessoas e sim para lançar produtos sacanas no mercado. Foi revelador nesta sexta-feira no jornal Hoje, da Globo, em que apareciam mil novos produtos para malhação nas academias. Era um monte de bobagens. Até que entrevistaram a mulher que faz a limpeza. Ela disse que dispensava os aparelhos, já que fazia muque na labuta diária. Acertou em cheio. É uma questão de classe social. Quem tem energia sobrando porque está enquadrado no mundo especulativo, precisa de academia para manter a forma. E quem sobrevive da própria força física se garante, endurecendo os músculos enquanto limpa a sujeira alheia.
Porque a ciranda financeira acena com liberdade quando sabemos que liberdade, na ditadura do dinheiro falso, é perder. Sim, perder. O fracasso liberta a pessoa das responsabilidades da vitória. É muito mais cômoda falhar no principal e se recolher ao ressentimento do que arcar com uma vida vitoriosa, que é uma prisão cheia de encargos. Não é possível vencer sem sujeitar-se ao esquema. Só resta ao cidadão expropriado de seu poder a perda total de sua vida numa sucessão de falhas em testes decisivos.
O tempo vai devorar sem dó esta época em que o fracasso aparentemente liberta e a vitória é uma exceção lotérica que cobra alto preço nos que conseguem emergir num mundo de iniqüidades.
RETORNO - 1. Imagem de hoje: vejam essa calçada em Amsterdam! Não poderíamos ser assim? Foto de Daniel e Carla Duclós. 2. Soube por um comentário de Urariano Mota no Comunique-se que Fausto Wolff, contista, cronista, romancista, jornalista e poeta premiado morreu aos 68 anos. Guri, portanto. Este país é um massacre. Disse coisas assim:
As pessoas não são mais necessárias como unidades da cidadania, já que o Estado foi sucatado, retaliado e terceirizado de todas as formas. Toda a grana preta carreada para as ONGs é apenas uma porção de uma realidade: a de que todo o dinheiro arrancado pelos impostos fica na mão das corporações ou das entidades privadas. Mas o que fazer com as pessoas extraídas de seu poder de cidadãos? O negócio é debochar delas. Vi hoje uma cena sobre seleção de gerentes em que os coitados dos desempregados dançam com balõezinhos coloridos par simular o trabalho em grupo. Falam até a exaustão em lideranças modernas, ou seja, as que eliminam a liderança em favor de um convívio artificial baseado na frescura.
Aí tinha um instrutor pontificando, naturalmente, pois a barbaridade, vista assim a olho nu, não passa de sacanagem, então precisa que alguém use os jargões da cultura fajuta que tomou conta do mundo do trabalho a partir dos anos 90. A palavra chave é “fundamental”. Tudo o que eles falam, ou seja, obviedades servidas em pó, pensamentos superficiais toscos, malandragens explícitas, estímulo às relações predatórias, é tratado como fundamental. É porque nada é fundamental num universo de atividades que não apitam no essencial, que é totalmente manipulado pelos meganhas do dinheiro especulativo.
Vi também uma jovem senhora falando asneiras sobre pesquisas de mercado. O que as pessoas precisam? Sobreviver, em primeiro lugar. Ou seja, morar e comer. Para isso precisam trabalhar, exercer atividades honestas remuneradas. Precisam ter acesso ao que os políticos vivem repetindo em vão, como saúde e educação. Precisam de cultura, informação, arte. Para que as pesquisas? Para inventar necessidades ilusórias nas pessoas. Para detectar demandas sinistras, como a vontade de destruir os outros (e disso se encarregam os videogames), trepar sem olhar a quem (e para isso serve a pornografia geral do mundo do espetáculo), fugir das responsabilidades (e para isso existe a psicologia de massa veiculada em programetes comportamentais das televisões).
Não é preciso fazer pesquisa de mercado para atender as necessidades das pessoas e sim para lançar produtos sacanas no mercado. Foi revelador nesta sexta-feira no jornal Hoje, da Globo, em que apareciam mil novos produtos para malhação nas academias. Era um monte de bobagens. Até que entrevistaram a mulher que faz a limpeza. Ela disse que dispensava os aparelhos, já que fazia muque na labuta diária. Acertou em cheio. É uma questão de classe social. Quem tem energia sobrando porque está enquadrado no mundo especulativo, precisa de academia para manter a forma. E quem sobrevive da própria força física se garante, endurecendo os músculos enquanto limpa a sujeira alheia.
Porque a ciranda financeira acena com liberdade quando sabemos que liberdade, na ditadura do dinheiro falso, é perder. Sim, perder. O fracasso liberta a pessoa das responsabilidades da vitória. É muito mais cômoda falhar no principal e se recolher ao ressentimento do que arcar com uma vida vitoriosa, que é uma prisão cheia de encargos. Não é possível vencer sem sujeitar-se ao esquema. Só resta ao cidadão expropriado de seu poder a perda total de sua vida numa sucessão de falhas em testes decisivos.
O tempo vai devorar sem dó esta época em que o fracasso aparentemente liberta e a vitória é uma exceção lotérica que cobra alto preço nos que conseguem emergir num mundo de iniqüidades.
RETORNO - 1. Imagem de hoje: vejam essa calçada em Amsterdam! Não poderíamos ser assim? Foto de Daniel e Carla Duclós. 2. Soube por um comentário de Urariano Mota no Comunique-se que Fausto Wolff, contista, cronista, romancista, jornalista e poeta premiado morreu aos 68 anos. Guri, portanto. Este país é um massacre. Disse coisas assim:
“O país tem solução? Tem e precisa ser drástica, se não quisermos que, desesperado pela dor da fome, o povo desça e o resto dance. O jornalismo pode ser uma solução. Outro dia perguntaram-me se era possível voltar a fazer do JB o melhor jornal do Brasil. Respondi que sim por dois motivos: primeiro, por causa do insípido e medíocre panorama da nossa imprensa; segundo, se recolocarmos a mocinha, a heroína, a estrela, no centro do palco. Estou me referindo à verdade. O erro dos que se propõem a entrar no ramo é imitar as grandes corporações, que só têm compromisso com o lucro e desabam sobre seu próprio peso, enquanto a maioria dos seus colunistas fala de uma vida que não viveu. Em princípio o jornal é o advogado do povo. É o advogado daquele que tem dinheiro para comprar jornal e não para comprar advogado. Os bandidos têm medo dos jornais, pois podem ser desmascarados por eles. A não ser, é claro, que os jornais sejam sócios dos bandidos, quer os privados quer os da Justiça, do Executivo e do Legislativo. O povo precisa sentir que o jornal é parcial; que está do seu lado; que não trata caricaturas de seres humanos que navegam em naves de papelão como pessoas sérias; que o jornal não admite justiça sem força e força sem justiça.”
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