Nei Duclós
A informática já foi tratada como vilã pelo cinema, principalmente em Superman III, em que o heroísmo fica a cargo das velhas tecnologias, como o raio X, o avião e o aço. O monstro digital enfrentado pelo cara da capa vermelha é um embate antológico dessa transição entre o velho paradigma, que expressava segurança, e a inovação, que ameaçava com a incerteza. Há uma sobrvivência desse medo em Matrix, em que o universo digital é ferramenta de tirania e domínio, que encanta as mentes enquanto suga os corpos. Mas Matrix traz o novo herói, Neo, que é um nerd com pinta de galã.
O nerd é capaz de convencer a humanidade em pânico que a mudança de tecnologia não precisa ser obrigatoriamente um pesadelo, é uma questão de conhecimento. Confie no nerd que ele tem a chave para transformar a ameaça em benefício, como acontece em Duro de Matar 4, quando um hacker enfrenta o ataque ao sistema integrado dos micros, celulares e câmaras de segurança do Império. Por trás dessa intensificação do heroísmo nerd está Steve Spielberg, que inverteu a posição da vilania, colocando nas tecnologias obsoletas – as máquinas barulhentas de Guerra dos Mundos, que dirigiu, e Transformers, que só produziu – todo o peso do Mal que a informática, ao lado da Lei, tenta eliminar.
Com uma ressalva: há a necessidade de uma visão menos rígida dessa evolução do velho para o novo. O importante é apostar na simultaneidade das invenções, como acontece quando os rapazes do bem usam, tanto em Transformers como em Duro de Matar, o rádio e as ondas curtas para poder se comunicar, já que estava tudo dominado. E nos dois filmes, a velhas armas de guerras, como rifles e revólveres, para sair da arapuca. Ou seja, os princípios, os valores, migram das máquinas para as pessoas, que usam o que têm à mão para se salvar. É nelas que se estabelece a decisão do conflito. E o Estado pressionado deve contar com indivíduos livres para poder se safar.
Em Duro de Matar 4, é a parceria entre o nerd e o herói analógico que resolve a parada. Em Transformers, é o garoto sem noção e a garota que roubava carros que se unem aos robôs do bem para impedir a invasão alienígena.
Não há bobagem suficiente que obscureça as intenções dos autores e suas inserções no mundo dito real. Tudo é política e quanto mais estapafúrdia que possa parecer uma obra cultural, nela está contida, de maneira clara ou oculta, os problemas, as esperanças, os conflitos que existem na vida social e pessoal dos envolvidos nos projetos. Mesmo que o álibi seja apenas “atender o mercado, a expectativa das pessoas”. O que parece pertencer à coletividade é, no fundo, algo de foro íntimo. Às vezes parece que as pessoas criam ao léu, sem nenhum vínculo com nada, vão inventando sem olhar a quem. Pois quanto mais se soltam, quanto mais acham que estão simplesmente voando, mais perto estão de dizer o que realmente lhes preocupa e incomoda.
Cabe ao ensaista descobrir essa chave e tentar fazê-la funcionar. É fundamental o trabalho de análise da indústria audiovisual, que domina o mundo. Não apenas interagir com a cultura da imagem, hegemônica, mas principalmente com as palavras dos roteiros que geram as imagens.
Não há como escapar da chama original da criação, a divindade que se acomoda dentro de nós. Basta querer, ter oportunidade e fazer as pontes necessárias para alcançar algo fora do circuito limitado de nossas relações. Extrapolar, chegar junto, se expandir, brilhar: eis nosso ofício, o de criaturas datadas que lutam pela transcendência. É o heroísmo possível num mundo relativizado. O herói frágil, pertencente a uma linhagem que vem de Lawrence da Arábia no cinema, ganha contornos de uma criatura bem definida, substituindo machismo velho de guerra sem chegar ao transexualismo.
Braços finos, cara de paspalho, tropeçando no cenário, esse personagem mais afeito às comédias invade os filmes épicos para puxar, junto com eles, os milhões de oprimidos que consomem filmes com uma gana que chega à insanidade. E o que é mais importante: ganhando a mocinha no final. Faltam apenas as obras-primas, como aconteceu com Lawrence, que façam desse personagem renovado alguém realmente eterno na Sétima Arte.
RETORNO - Imagem de hoje: Shia Labeouf e Megan Fox, em Transformers.
A informática já foi tratada como vilã pelo cinema, principalmente em Superman III, em que o heroísmo fica a cargo das velhas tecnologias, como o raio X, o avião e o aço. O monstro digital enfrentado pelo cara da capa vermelha é um embate antológico dessa transição entre o velho paradigma, que expressava segurança, e a inovação, que ameaçava com a incerteza. Há uma sobrvivência desse medo em Matrix, em que o universo digital é ferramenta de tirania e domínio, que encanta as mentes enquanto suga os corpos. Mas Matrix traz o novo herói, Neo, que é um nerd com pinta de galã.
O nerd é capaz de convencer a humanidade em pânico que a mudança de tecnologia não precisa ser obrigatoriamente um pesadelo, é uma questão de conhecimento. Confie no nerd que ele tem a chave para transformar a ameaça em benefício, como acontece em Duro de Matar 4, quando um hacker enfrenta o ataque ao sistema integrado dos micros, celulares e câmaras de segurança do Império. Por trás dessa intensificação do heroísmo nerd está Steve Spielberg, que inverteu a posição da vilania, colocando nas tecnologias obsoletas – as máquinas barulhentas de Guerra dos Mundos, que dirigiu, e Transformers, que só produziu – todo o peso do Mal que a informática, ao lado da Lei, tenta eliminar.
Com uma ressalva: há a necessidade de uma visão menos rígida dessa evolução do velho para o novo. O importante é apostar na simultaneidade das invenções, como acontece quando os rapazes do bem usam, tanto em Transformers como em Duro de Matar, o rádio e as ondas curtas para poder se comunicar, já que estava tudo dominado. E nos dois filmes, a velhas armas de guerras, como rifles e revólveres, para sair da arapuca. Ou seja, os princípios, os valores, migram das máquinas para as pessoas, que usam o que têm à mão para se salvar. É nelas que se estabelece a decisão do conflito. E o Estado pressionado deve contar com indivíduos livres para poder se safar.
Em Duro de Matar 4, é a parceria entre o nerd e o herói analógico que resolve a parada. Em Transformers, é o garoto sem noção e a garota que roubava carros que se unem aos robôs do bem para impedir a invasão alienígena.
Não há bobagem suficiente que obscureça as intenções dos autores e suas inserções no mundo dito real. Tudo é política e quanto mais estapafúrdia que possa parecer uma obra cultural, nela está contida, de maneira clara ou oculta, os problemas, as esperanças, os conflitos que existem na vida social e pessoal dos envolvidos nos projetos. Mesmo que o álibi seja apenas “atender o mercado, a expectativa das pessoas”. O que parece pertencer à coletividade é, no fundo, algo de foro íntimo. Às vezes parece que as pessoas criam ao léu, sem nenhum vínculo com nada, vão inventando sem olhar a quem. Pois quanto mais se soltam, quanto mais acham que estão simplesmente voando, mais perto estão de dizer o que realmente lhes preocupa e incomoda.
Cabe ao ensaista descobrir essa chave e tentar fazê-la funcionar. É fundamental o trabalho de análise da indústria audiovisual, que domina o mundo. Não apenas interagir com a cultura da imagem, hegemônica, mas principalmente com as palavras dos roteiros que geram as imagens.
Não há como escapar da chama original da criação, a divindade que se acomoda dentro de nós. Basta querer, ter oportunidade e fazer as pontes necessárias para alcançar algo fora do circuito limitado de nossas relações. Extrapolar, chegar junto, se expandir, brilhar: eis nosso ofício, o de criaturas datadas que lutam pela transcendência. É o heroísmo possível num mundo relativizado. O herói frágil, pertencente a uma linhagem que vem de Lawrence da Arábia no cinema, ganha contornos de uma criatura bem definida, substituindo machismo velho de guerra sem chegar ao transexualismo.
Braços finos, cara de paspalho, tropeçando no cenário, esse personagem mais afeito às comédias invade os filmes épicos para puxar, junto com eles, os milhões de oprimidos que consomem filmes com uma gana que chega à insanidade. E o que é mais importante: ganhando a mocinha no final. Faltam apenas as obras-primas, como aconteceu com Lawrence, que façam desse personagem renovado alguém realmente eterno na Sétima Arte.
RETORNO - Imagem de hoje: Shia Labeouf e Megan Fox, em Transformers.
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