Não estou me referindo aos Estados Unidos, mas a um outro país, que existiu de fato e era gigantesco, ocupava praticamente a metade do território atual do Brasil. Atenção: não era um território “equivalente” à metade do nosso país, era a própria metade atual do território, a metade do chão mesmo que hoje nos pertence. Esse gigantesco país oculto ficava, portanto, aqui mesmo no continente da América do Sul.
Vamos primeiro ter cuidado com a palavra estado, que vou usar aqui. Estado hoje é a unidade federativa pertencente à União. Já foi chamado antigamente de província. Mas existe outro significado, a de Estado, instituição que define a existência de uma nação. Todo país, independente ou não, tem a instituição Estado como sua essência, sua razão de existir. Chovo no molhado? Calma. Pois quero falar hoje sobre o Estado do Grão-Pará e Maranhão, que tinha como capital São Luís. Era um país à parte, que fazia fronteira com o Estado do Brasil. Este, tinha como capital Salvador.
Não se trata da província do Pará nem nada. Era uma nação mesmo, com administração própria, tributação diferente e relações diretas com Lisboa. Não se reportava ao Estado do Brasil, que eram outros quinhentos, que começava na Bahia e ia até o Rio Grande do Sul. O que ficava ao norte e ocupava também uma parte do nordeste (Maranhão, Ceará, Piauí) era um outro país. É costume confundir essa nação que não era o Brasil com as províncias geradas por ela, como o próprio Pará.
Esse país foi fundado em 1621 por Felipe III de Portugal, o mesmo Felipe IV da Espanha, pois todos sabemos que Portugal ficou submetido à Espanha de
Mais tarde essa nação foi repartida e acabou virando um punhado de províncias. Só em 1823, um ano depois da proclamação da Independência, é que a Guarda Imperial, com apoio logístico da esquadra inglesa, tomou Belém, ou seja, invadiu esse país estrangeiro que ainda estava sob as ordens de Portugal. Dá agora para entender a guerra da Independência. Os portugueses queriam manter o grande Estado do Norte. Tinha já desistido do Estado do Brasil, mas tinham ilusões de ficar com aquela outra nação, tão rica e cobiçada.
A verdade é que os portugueses continuaram dominando Belém e a Amazônia por um largo período depois da Independência. Diz um blogueiro da região, Ray Cunha: “ Navios, um atrás do outro, ainda saíam carregados de madeira de lei e essências pelo rio Amazonas rumo a Portugal, à luz do sol da Linha Imaginária do Equador, e a colônia portuguesa era dona dos armazéns do porto de Belém, única porta de entrada de cargas na capital, e ditava os preços das mercadorias”.
O historiador João Lúcio Mazzini diz o seguinte sobre a relação Brasil/ Grão-Pará: “Essa independência foi negociada sem nenhum benefício para nós. No século XIX, o Grão-Pará era um país à parte dentro do Brasil, pois operava com uma taxação alfandegária diferente e se reportava diretamente a Portugal e não ao Rio de Janeiro, que era a sede do império em nosso país. Essa foi uma forma de se preservar o estado da cobiça dos franceses e holandeses, já que era mais fácil tomar decisões se comunicando direto com Portugal sem passar pelo Rio. Então, com a adesão, passamos apenas de colônia européia para colônia brasileira, controlados por um governo que sequer tinha estrutura para cuidar de um país tão grande como o nosso”.
A professora Maria Lucia Abaurre Gnerre divulgou um trabalho que lança algumas luzes sobre o assunto: “Sobre a complexa história do estado do Grão Pará e Maranhão, podemos fazer um breve resumo de sua constituição político-administrativa: Em 1621, um decreto Régio estabelece que o Maranhão (incluindo a capitania do Piauí) e o Grão-Pará passam a formar um estado autônomo. Entre 1652 e 1654 os governos do Pará e Maranhão tornam-se independentes e, voltando a se unir em 1654, assim permanecem até 1772, quando são novamente separados. A separação só viria a se efetivar três anos mais tarde, quando o Pará anexa a seu território a capitania do Rio Negro. Em 1753, durante o governo de Francisco Xavier de Mendonça Furtado, estabelecem-se dois governos dentro do estado do Grão-Pará e Maranhão, um situado em Belém, e o outro
Para fechar essa introdução a um dos grande mistérios da nossa História, o depoimento do Prof. Dr. João Adolfo Hansen, professor de Literatura Brasileira da USP, e autor do livro Cartas do Brasil, do Pe. Antônio Vieira: “É preciso lembrar, ainda , que o título do livro, Cartas do Brasil, foi posto pela editora à minha revelia. Eu o critiquei porque é anacrônico, propondo que devia ser Cartas do Estado do Brasil e do Estado do Maranhão e Grão-Pará (1626-1697), mas não tive controle da edição.”
Fatalmente o pessoal da editora nunca ouviu falar em semelhante disparate. Quer dizer que a Amazônia fazia parte de um país estrangeiro? Fazia, mas não faz mais. Gringos, cuidado.
RETORNO - Imagem de hoje: Belém, no Pará.
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