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26 de fevereiro de 2007

A SÍNDROME DE SUPERSTAR

Enfim Martin Scorsese confirmou toda sua megalomania ao levantar cinco Oscars numa noite em que Clint Eastwood ficou de mãos vazias. Scorsese é o herói deste tempo de nulidades expressivas. Fico impressionado como existem pessoas que gostam de nos fazer de platéia. Por exemplo: às vezes sou adicionado no orkut por alguém que se diz meu fã e jamais manda qualquer mensagem pessoal para mim, só envia spams. Houve um que se considerava escritor e por mais que eu insistisse ele apenas acenava de um palco imaginário para sua multidão de pretensos leitores, entre os quais, imagino, me incluía. Depois, a mesma pessoa decidiu sair do Orkut pois descobriu que ninguém lhe dava pelota. Deve ter se ocultado num anonimato do qual o mundo certamente se arrependerá.

Também tem o artista que jamais me dirigiu a palavra, mas está sempre me enviando um spam atrás do outro. Ou das pessoas que me enviam beijos no coração. Acho isso execrável. Um beijo no coração fatalmente vai encher de sangue a boca irresponsável. Há os que enviam conselhos espirituais, que são os piores, pois acham que somos idiotas e que jamais lemos qualquer coisa a respeito. Tem os auto-ajuda, os bem intencionados, os românticos que enchem sua paciência com mensagens imbecis. Como são cheios de boas intenções, jamais retruco e os mando às favas. Por isso continuam, celebrando o dia da amizade, a emoção da perda de alguma notoriedade, entre outras obviedades. No fundo, querem platéia. Acham que descobriram a pólvora e saem pelo mundo a disseminar a boa nova ao gentio. Mas o gentio é bárbaro e está louco para acabar com o primeiro idiota que venha largar pombas para o alto pregando paz. Cuidado.

Na televisão, sobram exemplos de pessoas sem a mínima importância ou conteúdo querendo pontificar sobre a coisa como um todo. É uma sucessão de nulidades nunca vista. No esporte, então, é um assombro. O cara corre uns quilômetros e ganha a oportunidade de fazer sua biografia ao vivo em horário nobre. Eles explicam como é essa coisa de dar o seu melhor. Parece que existe platéia cativa para tudo. Basta acender uma luz de TV para milhões de pessoas levantarem os braços. Cada individuo da platéia numerosa está dizendo: me vejam aqui, estou na televisão, me aplaudam, agora vou falar como é que a coisa funciona e como vocês poderão aprender comigo quando eu falar como eu dei o meu melhor. Um beijo coração, viu?

Nunca vi coisa mais parecida com um choque de burros na água do que as vanguardas. Acharam que música era uma coisa careta e acabaram com a harmonia e os arranjos e o resultado foi o baticum. Acharam que o cinema era reacionário demais e hoje temos tanto idiotice que um sujeitinho raso como o Scorsese é considerado gênio. Nas artes plásticas, desde que exaltaram o mijador como obra de arte não paramos de nos surpreender com a falta de imaginação e talento. No teatro e nos espetáculos em geral, eliminaram essa divisão entre palco e platéia; tinha que integrar, entende? Resultado: não existem condições de ir a um show, pois na platéia é composta de superstars de ocasião. Quem grita uhúú mais alto, quem diz a frase mais espirituosa, quem sabe mais do que o artista no palco. Todo mundo é supersptar, para que artistas? É a velha vingança da mediocridade contra o talento.

Eliminaram a arte do imaginário nacional. Transformaram cada gênio em sabonete. É de chorar ver os especiais da TV paga (agora acessíveis no You tube) sobre Tom Jobim. O deslumbramento da apresentadora, veterana de TV aberta vazia, dá o recado para a platéia: Tom Jobim é tão genial que só explicando direitinho para vocês, imbecis, para poderem apreciar essa maravilha. Ou seja, retiram do ar um artista popular de primeiríssima água como Jobim e colocam em seu lugar a brutalidade pseudo sertaneja. Aí vendem o aniversário da morte (o que é um evento incompreensível, por que comemorar aniversário de morte?) como se fosse pirulito. Enquanto isso, a apresentadora dá suspiros fundos falando de Jobim, para explicar que ela sim entende de Tom e vocês, panacas, agora vão saber quem ele foi.

Haja saco para viver num país morto.
RETORNO - Imagem de hoje: capa do mais belo disco do mundo. A música fundamental do paraíso. Autor: a estrela maior do Brasil Soberano, a nação que foi assassinada.

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