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26 de junho de 2006
QUATRO PERSONAS EM CENA ABERTA
Uma indústria cinematográfica sólida, num país imperial que domina o mercado no mundo todo, e que tem longa tradição em teatro, não se destaca apenas pelos atores incontestáveis, como Al Pacino ou Merryl Streep. Há um time que se impõe pela continuidade de suas performances e aos poucos vai se firmando com artistas de primeiro time, num caminho mais árduo do que as estrelas maiores. Alguns, como Sean Penn, já possuem esse carisma de grandes atores e aquela persona farta de si mesma, de rosto exausto e energia plena, numa composição de sentimentos opostos que fizeram a glória de mitos como Bogart.
Outros, como Ed Harris, precisam cair do quarto andar em As Horas para nos lembrar o quanto pode um coadjuvante, guindado ao primeiro plano, e de olhar iluminado, em O Terceiro Milagre, contido e cínico em O Show de Truman. Harris trafega numa progressiva contundência que elimina as fronteiras entre periferia e centro do drama.
E, na medida certa para os projetos que abraça, Jodie Foster sempre acerta em cheio na sua carreira pontuada por personalidades em situações limite, empurradas para a coragem, em filmes nem sempre de primeira linha, mas com uma atuação invejável. Não só por ser convincente, mas principalmente porque consegue, com seu corpo mínimo, sua boca apertada, seus olhos aparentemente frios, atingir uma grandeza rara na arte que nos fisga pelo olhar e que planta poderosas raízes na mente.
Foster está assustadora (pelo rosto, pela postura, pela gélida presença) nas cenas iniciais de Plano de Vôo, um filme que escorrega a partir da metade para o fim, pois se transforma no lugar comum dos seqüestros e da ação mirabolante. Mas aquela estação de metrô em Berlim, quando encontra o fantasma do marido, e a parte em que carrega a filha embaixo do casaco e a coloca no avião, e sua ira quando descobre a armadilha onde está metida, fazem dela a atriz que gostamos sempre de ver, pois compartilhamos de sua aura, jogamos pesado junto com ela, e sabemos o quanto somos frágeis e enormes na nossa pequenez, que ela representa tão bem. Jodie nos seduz porque jamais sobra e porque, ao escolher seu território mínimo, ali implode para nos surpreender, a nós, que não damos nada na hora em que aparece, e que entregamos tudo no momento em que se despede. Cada vez mais madura, assumindo sempre sua idade, ela nunca esconde o que realmente é ou deva ser na narrativa.
Há ainda Nicholas Cage, excessivo, que, no início de carreira, tinha um pé no dramalhão (Asas da liberdade) ou na fanfarra da nascente pós-modernidade (Arizona nunca mais). Mas, também aos poucos, Nic Cage virou essa figura obrigatória dos filmes assistíveis, compondo personagens complexos como em The Weather Man, e virando assim um James Stewart na diversidade e na simpatia. Nicholas Cage tem o poder de atrair para sua persona todos os elementos de um filme. É um tipo de ator que não cansamos de ver, mesmo que soe antipático ou ameace, a certa altura, errar totalmente. Mas ele acerta, não por ser um predestinado, como Sean Penn, mas porque se esforça, e quando consegue, elimina as pistas desse esforço. Não lembramos o quanto sofreu para nos convencer. Ele nos ensina que sempre é possível se superar quando há determinação.
Sean Penn é o oposto. Sean está lá porque não há outro caminho para o diretor ou para ele mesmo. É convidado porque assim está escrito e encarna, com essa obrigatoriedade, o moderno herói americano, o pai da filha assassinada (Sobre meninos e lobos), o agente secreto a serviço da ONU (A intérprete), o condenado de 21 Gramas. Ele é um John Wayne sem convicção, que nos engana o tempo todo. Parece aquela pessoa conhecida que jamais assume que está no lugar onde se encontra, sugerindo sempre que está partindo ou mora em outro lugar inacessível. Mas por um instante, depois de fazer uma confissão de costas para a câmara, ele se vira e nos encara. É aí que Sean Penn se revela: um ator de verdade, que já dirigiu bons filmes e que consegue atingir o lugar um dia ocupado por Jack Nicholson. Sean é Jack antes da loucura.
RETORNO - Minha resenha sobre Carlos Henrique Schroeder e Ferreira Gullar, "O sol oculto", está publicada com destaque na revista Cronopios.
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