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1 de junho de 2006

GEORGE CLOONEY DECIFRA SEU CLÁSSICO





O diálogo do diretor de Boa noite e boa sorte, George Clooney, com seu co-roteirista Grant Heslov, nos esclarece sobre várias decisões que fazem deste filme uma lição de cinema, uma denúncia definitiva sobre a mídia comprada e um exemplo de realização pessoal possível em plena manipulação imperial da sétima arte. É no making off que Clooney explica, num sussurro cheio de gags hilárias, como o preto-e-branco usado se refere a documentários dos anos 50 ; como é certo escolher um ator não famoso para interpretar alguém famoso (no caso, David Strathairn, que interpreta o apresentador anti-machartista da CBS, Edward R. Murrow), pois isso cria um impulso na atuação tornando-a antológica; a importância do silêncio no clima de tensão de um filme que é, segundo as palavras do diretor, "de cabeças falantes"; e como esse silêncio foi aprendido de filmes de grandes cineastas.

DENÚNCIA - O diretor explica que a sala de espera do chefão da CBS Bill Paley (interpretado por Frank Langella, de presença shakespeareana, segundo Clooney) foi filmada de modo a ficar muito maior do que o poderoso Ed. Ao longo do seu relato, vê-se o carinho e a admiração pela equipe envolvida no projeto e como, ao se referir a ele próprio, foi duro na crítica à sua posição de super astro, com muito menos talento do que os atores convidados. Como isso o engrandece, neste filme obrigatório, em que todos os jornalistas do mundo devem assistir, para aprender onde estão metidos, já que a denúncia tremenda sobre a televisão de entretenimento, uma armação da direita, já estava pronta e funcionando a partir dos anos 50. Ou seja, a ditadura é quarentona e essa evidência não admite contra-argumentos.

CLÁSSICO - Concentro esta edição nessa decisão pessoal de George Clooney, um galã de séries televisivas, de radicalizar, fazer um clássico preto-e-branco sem tiros nem correrias ou explosões. Ficamos sabendo assim que basta querer para romper a barreira, basta ter coragem para cortar o fluxo da mediocridade imperante, basta dizer não ao que querem te impor. Pelo menos dizer não em algum momento da vida. No caso de Clooney, depois de anos obedecendo aos ditames de Hollywood, ele resolveu voltar-se ao que Hollywood produziu de melhor. Pois não basta ser admirador dos gênios do cinema, é preciso decidir firmemente a favor deles, usar as lições mais importantes e ir nesse caminho. Vemos, por exemplo, na televisão brasileira, como os autores das maiores bobagens e barbaridades são fãs de filmes clássicos (tanto é que chupam simplesmente, e de maneira tosca) ou de melodias famosas, mas acabam participando do emburrecimento geral da televisão e, em conseqüência, da nação.

BASTA - Costuma ficar assim: os bons moços bem formados fazem a pior televisão do mundo porque acreditam que o povo gosta mesmo é de porcaria. Contra isso o filme de Clooney é contundente. Uma das magníficas falas de Ed Murrow diz exatamente que esse álibi para reduzir a TV a um caixote de fios e luzes é de autoria bem conhecida, de pessoas que precisam destruir a inteligência da mídia e do público, invocando a mediocridade popular para fazerem o serviço sujo. Pois basta. É hora de reagir. De dizer não, ou vamos todos ao matadouro sem sequer dar um berro? Um berro que seja, daqueles que fazem tremer paredes.

OPORTUNIDADE - Quando havia civilização, Ed Murrow proferia seus textos demolidores escudado na cultura (citava Shakespeare), na lei (a Constituição tem a palavra final) e na liberdade de expressão (seu programa emprestava credibilidade à CBS). Para quem desconhecia esse episódio da história da imprensa, é um banho de informação. Para quem estava ermo de filmes antológicos, é um banho de cinema. Para quem espera uma oportunidade futura para se manifestar plenamente, este é o momento. Um galã de TV fez sua parte. O que resta para nós, tão grudados na nossa auto-importância de correção e vanguarda?

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