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30 de março de 2006

BARULHO DE CORRENTES




Aconteceu. O consenso da mediocridade está fazendo água. A revolta vem do coração do monstro, a mídia comprada. Primeiro foi Lima Duarte, que fez barulho das correntes que o amarram ao merchandising. Sem querer comparar, apenas elencando exemplos, agora é Luiz Cláudio Cunha, em primorosa carta para o novo diretor de redação da Istoé, Carlos José Marques,que vale a pensa ser lida no Observatório da Imprensa. Selecionei alguns trechos da carta, que é puro Diário da Fonte (com a devida licença de Luiz Cláudio Cunha, um dos maiores jornalistas do Brasil, de extensa e digna biografia):
"Vivemos tempos muito estranhos, em que as coisas que precisam ser ditas ficam escamoteadas, camufladas, sussurradas, caladas. Nada se reclama, nada se critica, para preservar amigos, cargos, salários, posições, espaços de poder, enquanto o jornalismo vai se diluindo e dissolvendo na sua incapacidade de autocrítica"


DEBATE - "Quero quebrar esta caixa preta e propor, com a serenidade recomendável e a prudência necessária, um debate sobre o papel que todos nós temos no empobrecimento continuado de algumas de nossas principais revistas semanais. A crise econômica, o custo do papel, a retração dos anunciantes, a concorrência da TV, o surgimento da internet e outros quesitos geralmente justificam a recorrente onda de enxugamentos nas redações de jornais e revistas, nivelando por baixo salários e profissionais. Esta é uma dura realidade, que não é nova nem parece prestes a acabar. Pelo contrário".

"Neste quadro recessivo, que inquieta patrões e assusta empregados, é natural o surgimento do "jornalismo de resultado" e seus profetas ? os executivos moderninhos que prometem redações baratas, revistas idem, amenidades muitas e reflexão zero. Apostam no padrão do leitor que consome mas não pensa, no perfil Homer Simpson que se satisfaz com o atendimento às suas demandas meramente consumistas, do estilo shopping center que simboliza o templo de devoção da classe média e seus periféricos. Para este tipo de leitor, com tanto a comprar e tão pouca disposição para ler, o jeito é o modelito USA Today, o jornalão fast food destes tempos midiáticos para uma leitura rápida, calórica e saborosa como um Big Mac".

"Assim, nossas semanais sofrem cada vez mais a tentação de atender a este novo mercado emergente, abdicando de sua função primordial: o texto mais consistente, mais abrangente, para refletir e ponderar sobre a salada de informações frenéticas e redundantes que o dia-a-dia de jornais, rádios, TVs e internet enfia goela abaixo do cidadão".

"A revista, que devia ser o oásis de reflexão para ajudar o pobre leitor a atravessar esta overdose semanal de notícias e mais notícias, abdica de seu papel e mergulha no turbilhão do jornalismo rápido e rasteiro. A estética vale mais do que a essência. A forma se impõe ao conteúdo. O texto curto confina os detalhes. A foto, espelhada e escancarada, come os espaços de uma informação cada vez mais estrangulada. Tudo induz uma leitura ligeira, quase leviana, para não afrontar o relógio e a agenda do nosso leitor tão apressado. E, em vez de procurar saciar a fome de informação e conteúdo, a revista sucumbe e se submete à magra dieta jornalística que ela diz ser exigência do leitor moderno. Alguém está enganando alguém neste jogo".

GRIS! - Chegou o outono e resgato do fundo da estante o abrigo gris (cinza) da hora. Os fios que um dia foram novos, firmes, vistosos, hoje estão embaralhados em algo inconsistente, mas meu corpo já está acostumado, como diz a canção. Bateu o vento, ameaçou a friaca e chego na sala vestido com minha armadura antiga e dou meu grito de guerra: Gris! Nada do que tenho agora se compara ao original, o casaco que comprei um dia numa loja chic do shopping e que cruzou os anos tem ter rival (como dizia o hino do bloco uruguaianense Pichichê). Ele me cobria braços , peito e costas com um gostoso abraço de puro algodão, desses que não se fazem mais (ou, se fazem, devem estar custando os tubos). Acordava e dormia com o casaco. Chegaram a escondê-lo, quando mostrou algumas feridas abertas depois de tanto uso. Mas eu sempre encontrava o esconderijo e, triunfante, chegava na área trespassada pelo frio com minha palavra de ordem, para espanto dos que me rodeiam: Gris!

Acho a maior graça nessas bobagens. Só não rio quando lembro daquele casaco que um dia esgarçou-se inapelavelmente. As roupas também morrem.

RETORNO - 1. Agora os repórteres poderão se informar sobre o mensalão, que foi confirmado no relatório da CPMI dos Correios. Basta clicar no link da Câmara. 2. A letra do hino do Pichichê, bloco do Clube Caixeral (o do Comercial era o Big Ben) conforme está guardado na memória, é esta: "Cruzando os anos/ sem ter rival/ O Pichichê/ está fazendo o seu cartaz/ na grande farra/ do carnaval/ Ele entra no salãããão.../ O Pichichê entrou/ todo o pessoal cantou/ e o resto se apagou/ Pa-ra-ra-rá.

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