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2 de janeiro de 2006

O ANO DA IMAGINAÇÃO





Inauguramos o ano dizendo com todas as letras o que queremos. Ou seja, vamos falar de política, pois sem nossa intervenção política tudo continuará na mesma. Este é um ano eleitoral, em que será escolhido um novo presidente da República. A presidência é a tábua de salvação para o povo desarmado, que fica na mão do coronelato dos grotões, que domina o Legislativo. É por isso que por tanto tempo foi cevado essa esdrúxula figura que hoje ocupa o poder, para que não tenhamos a ilusão de podermos escapar por aí. Mas como este 2006 que começa é o Ano da Imaginação, precisamos de uma saída. Vamos propor que o candidato vencedor seja um sujeito como você ou eu, que sabe exatamente o que fazer para o país voltar a ser soberano. Qual a primeira medida? Saber onde estão as torneiras do Tesouro Nacional, por que elas estão abertas por todos os poros e o que fazer para controlá-las. Não se trata de seqüestrar poupança nem conta corrente: apenas detectar por onde sai a grana do povo e impedir que se perca pelo ralo.

ESQUEMA - Já sabemos como funciona o esquema. O poder determina no orçamento uma verba para a publicidade ? vamos dizer, tudo o que se arrecada e ainda mais um pouco - faz uma campanha ("estou governando, veja mamãe, com uma caneta só") e distribui a bufunfa para conseguir votos para quê? Para liberar mais dinheiro. O impressionante é que esse dinheiro sai aos borbotões. Outra perna do sistema são os fundos de pensão e as estatais. Por que existem tantos cargos majestáticos nas estatais? Por que existem tantas aposentadorias milionárias? Porque a raposa cuida do galinheiro. Tirar o lobo do rebanho deve ser uma tarefa perigosa, mas um presidente da República como você ou eu terá que fazer isso. Depois de controlada a grana, o que fazer? Acabar com a festa da ciranda financeira, cortando as asas milionárias dos magnatas de bancos grandes e pequenos e pequenas arapucas dos chamados investimentos. Acabar com juros altíssimos para bufunfa que é colocada aqui a curtíssimo prazo. Sabe-se que a maior parte desse tutu circulante é apenas virtual e, pior, nem estrangeiro de verdade é. São os espertalhões brasileiros que fingem que são de fora e falsamente investem no país. O esquema é pirata e disso cuidou o noticiário econômico por décadas. Nem adianta aqui repetir. Pronto? Vamos ao próximo passo, tendo o cuidado de ir morar numa casa ou apartamento e deixando o Palácio para visitação pública, remunerada. Não vá fazer como a primeira dama e comprar uma tonelada de azeitonas e creme de leite com a verba suada da população.

OBRAS - É costume gastar uma nota preta reportando a miséria ou debatendo obras óbvias, como a duplicação da Br 101 de Floripa a Portinho, por exemplo. Basta um esquema misto: voluntários (povo mobilizado para ajudar, assessorar, fazer a arte final, acompanhar) mais alocação maciça de recursos (a grana que você e eu impediram de sair pelo ladrão) , mão-de-obra (milhões de trabalhadores hoje desempregados pela incúria) e equipamentos (que sobram nas fábricas, empreiteiras e pátios de prefeituras). Pode-se fazer a duplicação em um mês. A idéia é acabar com as estradas sucateadas em em um ano, arrumar todas as estradas e ainda começar a refazer toda a malha ferroviária. Empreiteiras? Estatize ou simplesmente faça um escambo: dê trabalho para amortizar e pagar a enorme dívida acumulada, que nada mais é do que a sacanagem dos juros altos aplicada à impagável dívida pública (as empreiteiras são os maiores credores). Acabe com todos, absolutamente todos os pedágios. Destrua os pedágios e refaça a estrada imediatamente na cicratiz que ficará. Parelalemente, lance uma ação prática de reflorestamento, a começar pelas margens e cabeceiras dos rios. Seqüestre toda a madeira cortada ilegalmente e crie estaleiros em todos os estados (acompanhados de escolas públicas para construção e uso de embarcações) . Incumba a Marinha de monitarar as obras que vão gerar milhões de embarcações, privadas ou públicas, para rios e mar. Corte relações com países que mantém cortadores de madeira em nosso país e expulse os meliantes, mediante vários pontapés na bunda.

CULTURA E FÉ - Impeça a geração de novas igrejas e imponha impostos em todas aquelas que expressem sinais exteriores de riqueza. Se houver reclamação, destrua seus principais templos. Corte o som imposto na população, desde a vizinhança retrógrada até os vendedores de merda ou os exploradores da fé. Substitua o atual sistema de televisão (concessão pública) por um novo sistema, que será distribuído a grupos de notório saber e especialização. Incentive as televisões universitárias e casse a concessão aos escroques que dominam o noticiário, os espetáculos e a mídia. É fácil: basta cobrar deles as dívidas em Previdência, por exemplo. Isso já dá o direito de o governo intervir. Implante uma vasta infra-estrutura de produção cinematográfica para tirar o cinema da mão dos bandidos que hoje querem entrar por todo o canto da chamada retomada do cinema nacional. Proiba o trotoir, os inferninhos e prenda imediatamente os responsáveis pela prostituição. Impeça a realização de festas públicas que incentivem a prostituição. Intervenha na radiofusão e proiba, no radio e na TV, a veiculação de anúncios. Crie para isso canais e emissoras especiais dedicados à publicidade. Imponha a difusão de música de qualidade, sem se ater ao falso debate sobre qualidade, pois sabemos que qualidade é música erudita, bossa nova, jazz e obras de alguns artistas de todos os gêneros. Destrua o ambiente pró-agrobrega e inaugure em todo o país escolas de música.

EDUCAÇÃO - É preciso retomar, em novas bases, a divisão entre primário, ginásio e científico. Por quê? Porque o primário, de apenas cinco anos, deveria dar (como já deu) as bases completas para uma vida cidadã digna. Porque ingressar no ginásio é um rito de passagem que estimula o amadurecimento, já que o aluno se diferencia dos iniciantes e começa a estudar francês, inglês, espanhol, latim. E porque o científico é um convite à ciência e à especialização, uma ante-sala da universidade, como sempre foi antes de ser destruído pela reforma da ditadura. Teu ministério contará apenas com pessoas capazes, da área, e nenhum político. Não negocie a soberania nacional com o troca-troca das negociações de cargos. Extinga todos os cargos das estatais e órgãos públicos que não tenham razão de ser. Acabe com as assessorias da diretoria e as diretorias das assessorias. Desempregue os aspones. Na segurança, baixe a lenha nos consumidores de drogas, não apenas nos traficantes. Corte o mercado e caia de bota e espora no tráfico de armas. Implante saneamento básico em todas as áreas urbanas, especialmente nas favelas, que se transformarão em bairros. E coloque a presença do Estado lá. Não admita esquemas paralelos do poder ilegal e ilegítimo. Seja presidente da República e preste contas à população e aos poderes Judiciário e Legislativo. E que isso não seja apenas imaginação.

RETORNO - 1. A foto é de uma escultura de Fulvio Pennacchi, que de tudo fez em sua longa e produtiva vida (1905-1992). Uma das coisas da qual me arrependo é não ter conhecido pessoalmente o grande artista. Tive a oportunidade e deixei passar. 2. Pedro Bial fez um BigBrother ontem com Lula. Colocaram o animador do programa que flagra pessoas ociosas falando mal uns dos outros para arrancar declarações pseudoverdadeiras do presidente. Como não suporto mais ouvir a voz do sujeito (que faz parte do barulho do Mal), fiquei afastado do Fantástico (o que faz bem à saúde). Mas num momento em que a mudança de canal fez o périplo na rede aberta, flagrei o seguinte: "Um presidente da república precisa ter a pôshtura de ishtadista" dizia o supremo mandatário da nação. Foi a única frase que ouvi e para mim bastou. Um estadista não se refere a si mesmo na terceira pessoa. Um estadista não diz que precisa ter determinada postura, ele simplesmente assume o cargo para o qual foi eleito. Lula repete o que os assessores dizem para ele: "Olha, Lula, um presidente da República precisa..." Como ele acha que ter uma postura é fingir o que não é, e que estadista é ser aplaudido em estádio, o presidente se contenta em repetir o que ouviu e aplica isso como sabedoria de tribuno civilizador. Vamos imaginar que um troço desses não seja reeleito e que no lugar dele não assuma seu clone ou um bonequinho de luxo da direita ou um troglodita, mas alguém como você ou eu.

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