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25 de outubro de 2005
A DESCONSTRUÇÃO DA VITÓRIA
Deu o que era esperado: os analistas profissionais não mudaram suas convicções depois da avassaladora vitória do Não e saíram a campo para enquadrar o voto do Brasil soberano em suas mentalidades viciadas no pensamento único. O argumento recorrente é que foi um protesto contra as políticas públicas de segurança do governo. Estas teriam fracassado. Todos sabem que não existe política de segurança. Existe guerra civil, em que o Estado omisso se dedica a confrontar uma situação criada pela falta de distribuição de renda e para defender os interesses dos coronéis dos grotões, estejam eles nas capitais ou não. Triunfa, nesse quadro, a grande putaria (o prefeito de Ribeirão Preto está sendo acusado de promover a sessão de fotos que aparece na última Playboy). Faz parte da destruição do país transformar as pessoas fragilizadas em repasto para a prostituição, que atinge desde crianças de menos de dez anos até as mais badaladas personalidades da exposição da carne. O povo sabe com quem está lidando e não é de hoje.
BLOGS - Outro argumento é que foi vitória do marketing do Não. Duvido que as pessoas tenham assistido as campanhas ridículas desse referendo ridículo. Mas não há opinião que se insurja contra a mesmice dos enquadramentos teóricos, em que são requisitadas figurinhas carimbadas da idiotia cerebral. O motivo é um só: foi a manifestação de soberania do povo em armas, que fez a nação por séculos e gerações. Isso, claro, nem consta na cabecinha premiada da mídia comprada, que agora, derrotada nos veículos tradicionais, migra para a internet com seus vícios. Os blogs jornalísticos, com seus comentaristas, a maioria, engraçadinhos, são a substituição de uma chance única de termos uma imprensa democrática. Os ex-poderosos das redações pontificam nos blogs com suas colchas de retalhos, reproduzindo o que não deu certo nos jornais tradicionais. É a exclusão velha de guerra: os luminares ocupam seus espaços na rede para repisar o erro, enquanto a boa guerrilha da diversidade da informação continua em desvantagem. Mas só por enquanto.
FURACÃO - Ontem, no Jornal Nacional (o release do poder) gastou muitos minutos com as vitórias do Sim (onde? Em duas cidades? E assim mesmo de maneira apertada) para confirmar suas teses de que o Sim tem a ver com a segurança da população e o Não, não. Jamais dão o braço a torcer. Jornalismo para eles é ficar de microfone na mão no meio do furacão para dizer: puxa, o furacão, vejam. Querem dominar as imagens da devastação, colocar lá o pobre do repórter que faz assim a sua carreira. O que precisamos é de reportagens desvinculadas da canalização dos interesses e opiniões do mercado de idéias. Tudo passa pelo dinheiro, pela compra e venda, pelos negócios. É de chorar a cobertura sobre o novo presidente da Fed. Como ele é importante, que coisa. O noticiário brasileiro é mais realista que o rei. Paga pau para o poder imperial assumindo o papel que nem a imprensa americana possui. Parece que são os donos de Wall Street. Enquanto isso, recebem prêmios internacionais pelo noticiário econômico, esse pilar da entrega da soberania. Noticiário econômico deveria se ocupar de um só assunto: exportamos proteína (a aftosa e a gripe aviária são apenas "detalhes")para acumular dinheiro em moeda forte, que volta para os seus donos em forma de pagamento de dívida externa. É o dólar em consignação (quando devolvemos o que não conseguimos reter). Puxa, o novo presidente do Fed, o "Banco Central" americano (dizem isso para a gente entender, como se soubéssemos o que é essa caixa preta do Banco Central). Que coisa.
NO FRONT - O repórter Ruwer (assassinado pouco depois), nos anos 60, na Folha da Tarde de Walter Galvani, intercepta um avião na pista que iria para Porto Alegre, para entregar a matéria sobre uma rede de prostituição no Rio Grande do Sul. Ruwer foi com JB Scalco, o fotógrafo que morreu do coração quando fez parte mais tarde de outra reportagem de denúncia (Galvani, me refresca a memória!). Tínhamos, então, jornalismo. Foi na época em que entramos para a profissão. Na mesma época, abateu-se sobre nós o AI-5. Desse buraco negro ainda não saímos.
EXTRA: Reproduzo dois comentários a respeito deste item:
"NO FRONT-engano teu,o Scalco descobriu-se com uma doença cardíaca em 82,durante a cobertura da Copa.Ele chegou a operar mas teve uma parada cardíaca,entrou em coma e um mês depois faleceu.Eu ouço cada história sobre o modo como ele morreu!Uns dizem que foi assassinado pela polícia,outros que foi acidente de avião.Mas posso te garantir que foi uma longa doeça que o afetou(pericardite).Sou cunhada dele,por isso resolvi te escrever prá não ficar essa coisa de história mal contada.Obrigado pela tua atenção,RosiRosi Email 12.12.05 - 8:24 pm #
NO FRONT - fala sobre o Jornalista Edemar Ruwer, meu irmão. Estranha a morte dele e logo em seguida a forma que ocorreu a morte do assassino, com um tiro na nuca, praticado por um policial, da Delegacia que era chefiada por um Delegado, que em seguida foi transferido para o DOPS. Teria maiores dados? Obrigado por ter lembrado do Jornalista Edemar Ruwer.Renato Ruwer Email 10.12.08 - 11:29 pm # "
Resposta (Nei): Não tenho maiores dados. Só lembro do Ruwer na época em que ele trabalhava na equipe do Walter Galvani. Grande repórter, de uma estirpe que se extinguiu. Ou melhor, foi extinta.
RETORNO - O perigo que se corre cobrindo o furacão substitui o perigo real de desmontar as redes de prostituição que imperam no país.
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