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29 de agosto de 2005
A PALAVRA DOS INTELECTUAIS
Cante comigo: Tudo vai máal/ tuuudo/ Tudo é igual/ quando canto e sou muuuuudo. Releve a desafinação. O importante é o que Caetano nos diz: se sei cantar e não consigo, nada muda. Urariano Mota nos dá a pista sobre a origem grega desse insight, reproduzindo de memória uma frase antiga: "se tens uma língua e não falas, então de que te serve ter essa língua?". Tudo as ver com o silêncio de alguns intelectuais, nesta quadra difícil da vida brasileira. Recolhem-se, preferem não falar. Ou falam de maneira escapista. Exatamente agora é o momento de produzir pensamento. A realidade nos desafia. Passou o tempo das idéias prontas, das ilusões. Mas existem outros que pegam o touro a unha. Vamos fazer um elenco de declarações, enviadas pelo jornalista Paulo Nogueira, que me mantém informado sobre tudo o que acontece no Brasil.
LEONARDO BOFF - Caiu a ficha do teólogo sobre nossa falsa democracia: "Previamente a tudo, importa reconhecer o caráter precário de nossa democracia. Ela ganha contornos de farsa pois não pode haver democracia digna deste nome na qual um terço da população é excluída e oito mil famílias controlam cerca de 700 bilhões de reais, aqueles conhecidos rentistas que financiam mensalmente o governo em troca de altíssimos juros. Se elencássemos os valores da democracia como são apregoados pela retórica política - liberdade, igualdade, justiça social, participação, desenvolvimento social com distribuição de renda e seguridades do cidadão - a nossa seria a sua própria caricatura para não dizer a sua direta negação". Prefiro chamar de ditadura civil.
EMIR SADER - Justificando Lula: "Lula ganhou porque os trabalhadores-sem-terra foram tratados como criminosos, como se tivessem introduzido a violência no campo, quando são vítimas privilegiadas da violência dos latifundiários e da polícia, enquanto lutam pelo direito de trabalhar, produzir, afirmar sua identidade pela educação e ganhar o direito de serem cidadãos. Em suma, Lula ganhou porque FHC fracassou." Ou seja, Lula ganhou, FHC ficou oito anos do poder, nós perdemos.
CHICO BUARQUE - "Se estou triste? É claro que estou triste com o que está acontecendo, mas a minha tristeza tem tanta importância quanto a alegria raivosa de quem nunca gostou dele". É verdade, tanto a tristeza dos aliados e cúmplices quanto a alegria raivosa dos adversários não tem importância. O que tem importância é o esvaziamento das lutas populares, da democracia e da fé na representação popular legitima. O que tem importância é o escancaramento do sistema corrupto da política brasileira, tanto do PT quanto dos outros partidos.
MAURO SANTAYANA - O grande articulista, sempre lúcido: "Com todos os seus erros, gigantescos, que nos fazem pensar que ele preferiu chegar logo ao poder a uma presença gloriosa na posteridade, será aventura muito arriscada o processo de impeachment. Para que as forças políticas tenham autoridade para promovê-lo, é preciso, antes, abrir a parte secreta da caixeta de Pandora, aquela que guarda os mistérios do governo passado. Mistérios como os das privatizações, do caixa 2 de campanhas, da lavagem de dinheiro pelo Banestado e pelo Banco Araucária, o caso Cacciola, as ligações de Fernando Henrique com Daniel Dantas, a desnacionalização do sistema bancário. Resta saber se estão dispostos a isso".
VERISSIMO - LFV, o texto absoluto: "A triste história do auto-emporcalhamento do PT tem uma outra triste história ao lado, a do tom celebratório, eufórico, com que está sendo recebida. O PT está pagando pela sua pretensão a não ser como os outros. Mas o que de maneira alguma poderia sobreviver à sua iniciação na irmandade do tudo igual é o seu idealismo. Esse tem que ser enterrado na lama, para aprender".
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