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11 de junho de 2005
COM DELMAR MARQUES, EM PORTO ALEGRE
Reproduzo aqui o prefácio que fiz para o livro de Delmar Marques, Os Minuanos - O resgate das Indias sagradas (Editora Paralelo 30, R$ 30,00). Ontem, no lançamento, tivemos uma noite e tanto na cidade da cultura, Porto Alegre: o encontro de muitos autores, que foram abraçar nosso jornalista favorito e romancista inovador e polêmico.
O Mundo Perdido
Nei Duclós
De mãos dadas, sonho e memória buscam o que História deveria revelar. O segredo está no sangue e no coração, instrumentos desta literatura que não faz distinção entre pesquisa e aventura, entre descoberta e catarse, entre biografia pessoal e perfil da raça. Delmar Marques segue a pista do vocabulário cevado em família para chegar à raiz do esquecimento e de lá retirar a luz que, contrariada, continuava oculta.Agora que a ciência descobre o óbvio - que a herança genética dos minuanos e charruas continua viva nos povos da fronteira -, é hora de seguir o passo do autor na recomposição de uma realidade que pulsa nas pedras, nos rios, no pampa e nos cerros. Ele precisou abrir mão da sua contingência de tempo e espaço para reconquistar o mundo destruído parcialmente pela barbárie civilizada. Reencontra assim, intacto, o tesouro cifrado que lhe foi entregue quando criança e que sua coragem decidiu revisitar.
Seu livro mostra que essa passagem não é feita sem dor. As feridas físicas respondem pelo esforço do espírito na busca do que nos é negado. O diferencial em Delmar é que ele não se acostuma com o silêncio, não aceita o resultado da guerra, não se adapta às imposições de uma ordem injusta.
Seu heroísmo vem da teimosa fragilidade diante da surra compacta do inimigo. Correndo o risco de assumir a vestimenta que tentaram lhe impor, ele faz do seu deslocamento pessoal o insumo de uma revelação.Para isso, não se desfigura: não pensem em encontrar nele a falsa humanidade de quem se expõe só para chamar a atenção, a abertura fajuta da pseudo modernidade. Ele continua o garoto da estância que não abre mão das suas raízes. Mas expõe essa personalidade para apresentar o homem construído por uma vivência de luta, onde a trajetória individual está cruzada com o andamento de um país grande demais para ser compreendido pelos sinais expostos na superfície.
Decidido, Delmar consegue fazer a literatura que o País precisa. Uma arte que reiventa o passado, que desvela o quadro insosso das certezas datadas, que reencontra a emoção do andar, que não refuga a briga e que por isso mesmo bate-se pela paz.Ninguém sairá imune da leitura deste livro, que não pede nem dá quartel para quem quer que seja. O mundo perdido que Delmar Marques revela é a presença em carne e osso de um fantasma escondido no mato. Dele sai sangue, mas a dor é apenas um detalhe.
O importante é passar por esta experiência que nos assalta como se um avô armado estivesse há séculos nos preparando uma tocaia.
DOCUMENTÁRIO - A pesquisa de Delmar também está gerando um documentário sobre os índios minuanos. Vamos ouvir o autor em sua manifestação no Comunique-se sobre esse assunto: "Obrigado Nei, Denise, que se deslocaram de Floripa e Sampa para Porto Alegre, Iracema, Talis, Leila, Jorge, Paula, Emerson, os que se manifestaram por e-mail, pelo comunicador ou pelo Orkut, enfim, todos que acompanham essa batalha e sabem das dificuldades em se colocar um livro no mercado. Tem muita luta ainda pela frente, pelos menos doze horas de filmagens para serem montadas. Estou vesgo de tanto ver e decupar imagens, algumas realmente maravilhosas do habitat das indias. Outras chocantes, dos sitios arqueologicos arrassados, cortados por tratores, valas imensas, da altura de um homem. Memória para sempre perdida. Paris, Roma, Atenas jamais receberiam tantos turistas se seus sitios fossem tambem destruídos. Livros deixariam de ser escritos, filmes deixariam de ser rodados, seriam cidades como quaisquer outras. A partir da arqueologia se levantam elementos para outras variantes culturais, literatura, cinema, teatro, impulsionadores do turismo, da economia. No Brasil, tudo se perde".
RETORNO - A revista Forum deste mês publica o conto Fluxo Negro, do meu filho Daniel Duclós, na coluna Vivaletra, de Eduardo Maretti, que descobre em Daniel uma linhagem que vem de Leopoldo Lugones (1874-1938), "em que se associam o terror e uma vaga, porém marcante, ironia. O efeito, em quem lê, é o de um inevitável estranhamento." É a estréia de Daniel como escritor reconhecido na mídia impressa.
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