Entre as pautas que jamais fiz ou pedi para fazer, está a magnífica reportagem sobre os autores de títulos brasileiros para filmes inesquecíveis. Quem serão eles? Quem é que teve a audácia de titular o clássico Shane, de George Stevens, com o bombástico Os brutos também amam? E de onde surgiu Assim caminha a humanidade, para Giant, com James Dean, Rock Hudson e Elizabeth Taylor? Depois daquele beijo, para Blow-up, provocou um ataque de riso na época do seu lançamento. Mas não deveriam rir. É criação pura, atrelada ao mais escabroso marketing. Faz parte do imaginário nacional. Envolveu gente anônima, redatores, ou talvez os próprios distribuidores, que deveriam fazer esses títulos às gargalhadas depois do expediente, consumindo bebida falsificada (que é só o que tem no Brasil). Quanto mais quente, melhor, de Billy Wilder, é uma transcriação de Some like it hot, ou Tem gente que prefere fazer com tesão, ou estou enganado e também sou candidato a traduzir títulos estrangeiros de filmes? Toda língua estrangeira para mim é uma mistério. Não consigo conceber pessoas emitindo aqueles sons alienígenas. De onde tiram toda aquela lógica? E dizem tudo aquilo com o maior desplante.
LÉVIS - É uma tendência: a gente sempre acha que as coisas surgem do nada, ou estiveram sempre à disposição. Mas alguém queimou neurônios (ou a pestana) para inventar o que usamos com a maior displicência. A autoria some quando algo faz muito sucesso e se espalha meteoricamente, tornando-se parte do acervo comum. O iê-iê-iê é uma designação nacional para o rock dos 60. Quem inventou, o Carlos Imperial? Bossa nova teria surgido de um engraxate que comentou o sapato branco, usado sem meia por Sérgio Porto, o Stanislaw Ponte Preta: bossa nova, hem, doutor. Ou seja, já estava inventado pelo povo e serviu de batismo para o samba recriado por João Gilberto. Mas bossa vem do francês bosse, que é uma atrofia, uma corcunda, portanto um diferencial. Não acredito em criação coletiva. No meio da multidão, toda ela criativa, sempre tem os que bolam coisas especiais, e estas se propagam. Coloco os autores ocultos dos títulos de filmes entre esses criadores. O bagunceiro arrumadinho, título para filme de Jerry Lewis, é uma graça por ser tão tosco. A tradução literal costuma provocar gagalhadas. Até hoje lembro uma rádio argentina dar o crédito para a música tocada minutos antes: acabamos de oir Socorro, com Los Beatles. Help nunca foi tão cucaracho. Mas é preferível a marca nacional do que o paga-pau explícito ao império estrangeiro. All type! me dizia meu amigo editor de arte depois que eu pedia algo só com letras, sem imagens. Delivery, dizem para a entrega. Eitchi bi ôu, me corrigem quando digo agá bê ó. É por isso que insisto: em Uruguaiana, não tinha essa frescurada não. Era filme com Jérri Lévis e Dêan Martin. Levei um choque quando um narrrador disse que o Jerry era Louis. Um bom cacete, repliquei. É Lévis. E mãos ao alto, em inglês, é chamuchalei. Era assim que dizíamos: chamuchalei aí, e o inimigo levantava os braçso, rendido. Rânds ãp, ora rânds ãp.
INTERAÇÃO - A moda agora é colocar o título original seguido pelo complemento em português (a língua subalterna). O pequeno little, como diz o título do desenho animado do Spielberg. Pequeno Little, convenhamos, é pior do que jérri levis. Apocalypse Now é insubstituível (fim do mundo agora?). Meus títulos favoritos para filmes brasileiros são: aviso aos navegantes, matou a família e foi ao cinema, carnaval de fogo, deus e o diabo na terra do sol, São Poaulo S/A (a obra-prima de Luis Sergio Person, um dos maiores filmes brasileiros de todos os tempos). Alguém lembra de títulos inesquecíveis? Aklguém sabe quem inventountudo isso? O Diário da Fonte, com tantas visitas e tão poucos (mas fiéis) comentaristas, nunca foi muito interativo. Mas desta vez acho que vale a pena.
RETORNO - Vejam as fotos do massacre americano no Iraque e no Afeganistão. Crianças, mulheres, homens, todos morrendo, enquanto a gente diz delivering.
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