Universo Baldio é um romance que procura resgatar pessoas escondidas na memória e linguagens atiradas sem destino. O livro servirá de apresentação oficial, na Feira do Livro de Porto Alegre, neste sábado às 17h30, para incluir pessoas e literaturas variadas, que precisam vir à luz com mais força, para as sucessivas gerações não esquecerem que existem escritores que encaram o ofício com o espírito da missão a ser cumprida. Nós, criaturas humanas, somos a cultura. E nossos livros são nossas sínteses, as vitrinas de almas invocadas, que não possuem a vocação do esconderijo, mas da apresentação e do abraço.
PORTINHO - Lembro de Caio Fernando Abreu cheio de dedos ao me propor algumas pequenas mudanças no meu livro Outubro. Lembro Caio levando Outubro para Ligia Averbruck, aquela a quem jamais poderei agradecer o suficiente, para que me publicassem, eu, um dos poetas da praça. Lembro Juarez Fonseca feliz me contando que Mario Quintana tinha escrito o prefácio do meu segundo livro, No Meio da Rua, que foi editado pela L&PM, pela mão de Ivan Pinheiro Machado, amigo comum do inesquecível Gilberto Gick, que foi-se prematuramente. Lembro Cláudio Levitan e sua Eneida Serrano, violão e fotos e conversas sem fim na nossa casa em Ipanema, lugar que tornou-se uma confluência de tantos escritores que lá iam para conversar e conviver, uma coisa que perdemos depois que a ditadura jogou sal em nossas vidas. Lembro Levitan se inspirando nas cadeiras de palha na minha casa para fazer aquelas ilustrações clássicas de Outubro. Lembro Raul Elwanger me mostrando a música que fez do meu poema Apesar de tudo, que foi um dos hits da exposição da praça. Lembro Marco Celso Viola com seus coturnos de milico, em plena era militar, aparecendo no Centro Acadêmico para fazer comigo uma amizade eterna. Lá no Centro Acadêmico, lembro de Mariza Scopel com seus contos radicais e lembro Roque Callage, ainda menino nos trazendo poemas primorosos. E agora vejo Clovis Heberle, que viu tanto de mim e da vida da nossa geração em Universo Baldio, me dizendo o quanto gostou do livro e quanto de afetividade me será inundada nesta visita a Porto Alegre que começa amanhã, ele que me receberá junto com sua esposa, minha cunhada Laís, que sempre vai aos meus lançamentos. E lembro Oliveira Silveira com seus poemas poderosos, recitando conosco, junto com Nazaré de Almeida, naqueles recitais que sempre tinha público, porque nada havia na época, éramos muito poucos naqueles tempos sombrio, mas que foram iluminadas pelo talento múltiplo que explodiu na capital riograndense, a cidade da nossa juventude. E lembro Muts Weyrauch folheando meus poemas para em cada verso descobrir uma canção nova.
SAMPA - E agora lembro meus amigos de Sampa, o Toth com sua genialidade travessa, Marcelo Min com seu olhar que a tudo inclui e a tudo denuncia e a tudo compõe com seu inumerável talento. E vejo Antonio Gaudério fazendo o açougueiro de Heliópolis subir na laje para fazer uma foto sobre negócios na favela, que ele participou porque gosta do poeta e porque ele também é um artista sem igual. E lembro Luiz Moraes com sua convicção que formamos uma dupla nesse jornalismo que aprendemos a fazer juntos. E Daniel Del Fiore, com sua tranqüilidade maravilhosa e sua lucidez, e Odair Souza com sua pertinácia, ele que é um jornalista que desperta cada vez mais para esta profissão tão cheia de altos e baixos. E lembro Wagner Carelli publicando dois livros meus, me resgatando do exílio, me jogando na praça novamente com dois trabalhos editados por ele de maneira primorosa. E Luciana Felix, muito menina, querendo aprender e hoje detonando neste ofício sagrado que é escrever. E vejo minha mulher, Ida, minha primeira leitora e esposa de toda a vida, e Miguel com seu Consciência e seu blog que traz textos fortíssimos, clássicos e originais. E Daniel, que está lutando para ter uma vida de escritor, com todo o talento que Deus lhe deu e ao lado da esposa Carla. E minha filha Juliana, grávida já de quase sete meses, de Marcos, que nasceu e se criou na cidade que escolheu para viver, Búzios. E meus irmãos, que optaram por esta ilha onde me encontro e minha irmã, lá em Campo Grande, emocionada como sempre. E a todos recolho pelo tempo, com a o braço imenso da literatura, que é nossa marca sobre a terra. E lembro Eduardo San Martin, novaiorquino perene, que aos 16 anos chorou ao compartilhar nossas primeiras conversas, ele que hoje é um escritor consagrado. E lembro meus amigos de Uruguaiana, Miguel Ramos,. Anderson Petroceli, Rubens M. Junior e o grande poeta Ubirajara Raffo Constant. E lá está Bebeto Alves, que me espera este fim do mês. E lembro todos os outros que não cito porque é enorme demais esta lista. Agora, para a praça de Portinho. Lá nasce a poesia de uma geração que não se calou e hoje colhe os frutos da sua coragem.
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