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9 de dezembro de 2003

A VEZ DOS PEQUENOS


O jornalista sem nome, aquele que faz notas para sites de notícias da Internet, que vai a vários eventos com máquina digital e lap-top para desovar inúmeros textos e imagens em tempo real, que abastece de informações as personagens-griffe das redações, que tem seu texto de assessoria de imprensa assinado por algum colunista, que é primeiro da lista no rodízio bárbaro dos desemprego, que trabalha loucamente por um salário ínfimo, e que, à parte isso, tem todos os sonhos do mundo, possui a chave do destino em suas mãos: ele acumula o que os outros desperdiçam e na hora decisiva, estará pronto para fazer História.

ESPERANÇA – Há um clima pesado de desesperança no ar. Faltam perspectivas de melhora, vê-se a profissão escorregando para o fundo do poço, o Brasil sendo dilapidado em corrupção e violência, mas garanto à juventude: sempre foi assim. O que segura o Brasil no pincel é quando nadamos contra a corrente, é quando alguém esclarecido assume um posto de chefia, quando ele funciona como um imã para novos talentos, quando uma escorregada da mediocridade no poder deixa entrever, para o público, o quanto estamos perdendo. Basta um apresentador se destacar na mesmice nos telejornais, uma reportagem gloriosa de alguém desconhecido, a volta da velha forma em alguns jornalistas veteranos e pronto, está estabelecida a prioridade da vitória da esperança. Se Antonio Callado, como conta o texto pessimista de João Ubaldo Ribeiro no domingo no caderno 2 do Estadão, achou, no fim da vida, que o Brasil não tinha mais jeito, é sinal que o Brasil tem reserva de sobra para auto-superar-se. Se alguém como Callado, que lutou a vida toda pelo País, sente-se impotente diante do que ele acha ser inexorável, é porque temos cidadãos de fibra, lúcidos para entender a complexidade da situação. Callado é um sintoma importante: a de que podemos nos suprir de esperança quando tudo parece perdido, não por uma opção de otimismo sem base, mas porque temos uma cultura de preocupação com o futuro do Brasil e esse futuro está em quem acha-se pequeno diante da avalanche. Pode parecer um paradoxo, mas é assim que eu vejo: se somos capazes de nos desesperar, é porque temos bala para gerar nova esperança.

REAÇÃO - Vocês leram, no Comunique-se, a reação ao texto de José Paulo Lanyi que aborda a indiferença na nossa profissão? Vale a pena. Lanyi, o plantador de amizades, abriu largamente seu coração, sem nenhuma amarra. O resultado foi assombroso. As pessoas tem guardada uma quantidade enorme de lucidez, que por mais pessimista que seja, sempre é semente de novas esperanças. O importante é fazer como Lanyi: não imaginar qual seria o resultado, dizer o que pensa e sente e pronto. Vale para o relacionamento interno das redações. Você me desculpe, mas pior que isso não posso fazer (a frase imortal de Antonio Maria, diante de um produtor de TV que pedia sucessivamente para ele piorar o magnífico texto que tinha escrito). Eis uma boa colocação. Quatro eventos num dia: por que o sr. não chama a sua mãe para ajudar? Pode ser a porta da saída do emprego, mas se um monte de gente fizer, qual seria a repercussão? Acho que existe muita folga por parte das chefias porque se sentem impunes. Vá catar coquinho, essa pauta é ridícula. Tenho uma muita melhor. Essa reportagem de responsabilidade social inclui o toque de que tudo não passa de dinheiro público, que as empresas usam para promover-se? Esse dossiê não foi plantado? Essa materinha humana não foi feita no Natal do ano passado? Isso tudo pode ser dito depois de um repórter pastar muito. Ele tem cacife para se colocar. Aproveite para tentar impor algo, mas sem raiva nem falta de consideração (minhas frases aqui são apenas sub-texto, aquilo que impulsiona o verdadeiro texto). Tenho algo fantástico para propor: uma reportagem que ninguém ainda fez e que está pedindo para ser publicada. O chefe, se for decente, vai gostar. Se for ruim, vai querer assinar o teu trabalho. E se for execrável, colocará sua idéia no lixo. Mas no dia seguinte tem mais jornal. Volte à carga.

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