Páginas

16 de dezembro de 2003

O RIO NÃO MORRE


“ También se muere el mar” (Garcia Lorca)
“Aquele rio era um cão sem plumas” (João Cabral de Melo Neto)


Nei Duclós

Não se mata um rio
como não se enterra
um morro
Como a fogueira
não se põe no bolso
Como um leão
não pede socorro

Um rio terminal
é a soma da baba
do rebanho
viscoso no que tem
de sono
aéreo no que tem
de sonho

O mar recebe o rio
feito de escombros
O mar pode morrer
(Netuno exangue)
Não por obra do rio
que guarda o sopro
Envenenado talvez,
mas nunca morto

Um rio sobrevive
sem suas vertentes
Um rio pode seguir
sem ser corrente
Um rio não é a escama
de nenhum peixe

Ele será sempre o rio
da minha infância
O Uruguai antes
do saque
touro frente à lua
surra de gigante

Nesse rio sem fim
mora meu povo
Cobre de minuano ao frio
Charrua de invencível
lança

Não se mata um rio
O sol não cabe
numa estante
A eternidade acampou
e faz a ronda


REENCONTRO

Nei Duclós

Te reencontrei, cidade
E estavas à minha espera
como um pássaro sagrado

Tuas ruas abertas como asas
Calçadas varridas de memória
Anjos da minha guarda

Tuas mãos gastas pela demora
Teu rosto sem lágrima
Teus rios de eterna água

Te reencontrei, cidade
Como um filho tardio
o último que retorna

Estavas pronta, mãe que sabe a hora
Estavas forte, perfil de flor teimosa
Estavas maior, amor que não se dobra

RETORNO - O poema Reencontro está muito bem acompanhado na seção Cantinho do Poeta, no endereço eletrônico www.portaluruguaiana.com.br , graças a Anderson Petroceli, o criador cultural responsável pelo site e fotógrafo maior, profissional que sabe como ninguém revelar a dimensão mágica da geografia natural e urbana de Uruguaiana.

Nenhum comentário:

Postar um comentário