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21 de setembro de 2003
O LUGAR DA PUBLICIDADE
Credibilidade de um veículo não-corporativo é a separação entre jornalismo e publicidade. Nos corporativos, as duas atividades podem ocupar o mesmo espaço, desde que se preserve, no jornalismo empresarial, alguns princípios básicos. O anúncio e o marketing precisam ser aliados, mas não cúmplices nem inimigos das redações.
DOMINGO – Deve-se estranhar uma conversa tão trabalhosa num domingo, mas no momento em que você está impregnado de uma tarefa, não existem limites de tempo. Cada assunto abordado aqui é fruto de reflexão muito antiga, que é dinamizada sempre a partir do dia anterior em que vai ao ar. Comunicação é encarada como vício, mas eu prefiro abordá-la como missão. Nem sempre nascemos para o ofício, somos desviados de nossos sonhos para encarar a dura vida da mídia. Um texto primoroso sobre isso está na Carta Capital deste fim de semana, em que o Mestre aborda a tragédia que levou-lhe um parente muito próximo e querido. Em contraste com a dignidade estampada na melhor revista do Brasil (que tem uma matéria de capa assustadora sobre corrupção), temos em mãos a edição de domingo dos jornalões, em que a Prefeita sorri como noiva, acompanhada ao fundo pelo primeiro casal investido de padrinho. Tratado como coisa normal, o fato merece repúdio não pelo evento em si, mas pelo evidente dinheiro gasto nele, e por expressar, pelo menos para mim, a indiferença do Poder em relação ao País que pretendeu salvar-se pelo voto elegendo os principais participantes da cerimônia.
CONTRABANDO – Na semana passada, em substituição ao dono da Folha de S. Paulo, o editor Fernando Barros e Silva colocou o dedo na ferida comentando as edições de dois veículos que estampavam a intimidade da prefeita e a colocavam como imbatível nas próximas eleições. Um pouco antes, a mesma Folha publicou extensa matéria de Fernando Rodrigues sobre as “reportagens” pagas no Paraná. É um item que faz parte do nosso tema hoje. O Observatórtio da Imprensa insiste que não deve haver matéria paga de jeito nenhum e que não basta identificá-la, visualmente, como não pertencente ao corpo jornalístico. Como militei em todas as áreas da comunicação, considero esse um assunto espinhoso que deixo para os especialistas. Prefiro ater-me ao básico e simples. Você, como editor, diretor de redação (um cargo que, parece, fugiu para sempre da mão dos jornalistas depois da gestão Pimenta Neves, do Estadão) ou repórter, precisa agir estrategicamente para anular os malefícios de uma publicidade mal dirigida, ou simplesmente enganosa. Todo veículo de comunicação faz parte de uma empresa, portanto “jornalista de empresa” aplica-se a qualquer um. Com a diferença de que uma empresa de comunicação deve manter a isenção do que veicula, enquanto um departamento de comunicação ou assessoria precisa veicular corretamente as informações de interesse, sem ferir a verdade ou exagerar favoravelmente os fatos. É uma vida dura, mas ninguém está aqui a passeio .
REALISMO - Mesmo na imprensa dita normal (fui testemunha disso, e olha que eu trabalhei em alguns dos mais importantes veículos de comunicação do País) existem as reportagens de interesse. Existem as listas negras, os destaques obrigatórios, as personagens sobre as quais nunca se deve escrever absolutamente nada em contrário. Qualquer redação está amarrada a um sem número de interesses, que vai desde os anunciantes (os mais poderosos) até as idiossincrasias do dono do veículo ou do editor (muitas vezes mais realista que o rei). O que cabe ao jornalista é reforçar as bases do seu ofício: escutar todos os envolvidos, trabalhar a qualidade do texto, aprimorar a abordagem para evitar conflitos inúteis, impor-se pela respeitabilidade e não curvar-se quando o equívoco é excessivamente explícito. Tenho três carteiras de trabalho (uma totalmente preenchida) devido a esse tipo de comportamento, mas posso dizer que fiquei muitos anos em alguns lugares aprendendo a trabalhar da melhor maneira possível. Mesmo numa revista corporativa, às vezes uma imposição que parece pífia pode render uma bela matéria. O importante é duvidar de suas certezas, abrir-se para a diversidade e não iludir-se nem com a virgindade nem com a hipocrisia. Pois por mais que digam o contrário na faculdade, a realidade das redações é dura, e esse tema é o principal espinho.
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