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30 de agosto de 2021

TUA ARTE

 Nei Duclós 


És feita de unhas roxas e arranjo de flores 

Mas essa não é tua arte 

Feita de amores variados e amizades drásticas 

Todas fantásticas

Mas essa não é  tua arte 


És feita de pele mediterrânea e cabelo de ouro

Cultivada em viagens pelo mundo 

Jerusalém Mar Morto Monte Carlo

Jamais Paris que em ti não cabe


Pesas na maquiagem para ir à ópera

mas essa não é tua arte


Tua arte é quando sou o alvo

Ao te querer sem desconfiar

Que entre tantas de ti és única 

Com teu jeito de touro ariano

O que chega primeiro em Pamplona

E rasga o ventre do infeliz palhaço 


Mas sou resistente 

E aguardo que canses, açúcar demerara

Disfarçada em mulher má e impaciente

Sei onde pousa teu pé no sofá da sala

Lá permaneço em guarda, miserável gato



29 de agosto de 2021

DESTINO

 Nei Duclós 


Compor perdido no deserto

Sem esperança que alguém escute

Funda solidão de um criador sem rumo

E o destino, pássaro indiferente

Voa para longe com seus arrulhos


Só tenho o amor que insisti sem fôlego

Que hoje me transpira neste frio imenso

Sou lagarto que ao acordar machuca

Por sobreviver no mundo sem sentido 



28 de agosto de 2021

A FLOR NA CALÇADA

 Nei Duclós 


Foi-se a palavra

Seu dom,  sua fábrica 

O poema  a qualquer hora

A prosa sem amarra


Ficou presa a palavra 

Nos limites do rábula

Nas calúnias, na espátula 

De sepulcros caiados


Ficou a flor que força a calçada

E a vontade que temos de ressuscitá-la



22 de agosto de 2021

TRIBUNO

 Nei Duclós 


Senti que era o momento exato

Para o qual me preparei em sete décadas 

Falei e todos silenciaram

Para ouvir a boa palavra 


A multidão foi um tambor sagrado

Eco do coração  de amor tomado

Cabe na praça a solidão liberta 

Até hoje os gritos ocupam espaço


Voltei para o lugar de origem

Lá toco a oficina, meu louco evangelho


Não prego religião 

Levanto âncora 

Sou roto capitão

Tribuno do sonho



15 de agosto de 2021

A VONTADE INSONE

 A VONTADE INSONE


Eu passo a noite acordado 

Porque não posso dormir 

O peso do meu passado 

E as ameaças por vir


A morte do filho amado

Os vírus e o bisturi

As despesas sem barragem

E a ditadura sem fim


Arte é  vida que respira 

E ainda vela por mim

A poesia liberta

Do destino de ter fim


Çom palavra tenho a força 

Na quebra da impostura

Por ela nada se estraga

Sonora voz que me resta 


Nenhum tirano me apaga

Na noite que faz sofrer

Sou fruto de gosto amargo

Só durmo no amanhecer


Nei Duclós...